quarta-feira, 18 de novembro de 2009

O Alicerce - parte 2

Calei-me por uns instantes, esperando por uma resposta.
- Lembro, claro que eu lembro. Qualquer um que tivesse visto o seu rosto...
Parou de falar de repente, como se estivesse falando demais.
- Que bom que você lembra. Agora, acha mesmo que eu vou correr o risco de virar um zumbi de novo?
Ele começou a morder o lábio inferior. Processando uma resposta. Seu rosto se iluminou, pelo visto, encontrou...
- Você corre esse risco com qualquer outro que você ficar, não é?
Para isso eu já tinha resposta.
- Quer dizer que com o Ruan eu corro os mesmos riscos do que se ficasse com você? Francamente, eu achava que você pensava...
- Então você não corre esse risco com ele?
- Corro, claro que corro, só que o risco é menor, bem menor.
- E como você tem tanta certeza?
Agora ele conseguiu o que queria, tocou na ferida. Meus olhos se encheram de água e abaixei a cabeça, não suportava ter que olhar para ele.
- Ele te ama, embora nunca tenha dito isso, todo mundo sabe que aquele guri morre por ti, Marina. E se você não sente o mesmo por ele, por que...?
Não consegui conter, as lagrimas agora escorriam pelo meu rosto.
- Quando uma pessoa normal perde uma perna, ela precisa de socorro urgente. E depois de muletas, porque perna mecânica sairia muito caro. Ela necessita da muleta para continuar a andar, para não cair, para não se machucar.
Eu fitava o chão, enquanto esperava que o raciocínio dele estivesse junto com o meu.
- Mas conforme o tempo passa, a pessoa precisa trocar de muletas, nao é? Porque elas ficam velhas...
Ele falou, quando entendeu a minha filosofia da historia de um homem de uma perna só.
- Mas nós estamos falando de pessoas, de sentimentos, não de objetos inanimados que podemos colecionar e colocar numa prateleira ao longo da vida.
- Ta, me desculpe, foi você que começou com essa historia de muleta...
- O que eu quis dizer é que enquanto você tava lá, todo contente se comendo com aquela miniatura de gente, eu sofri e chorei muito. E quem ficou do meu lado? Reergueu-me e colou os pedaços? Foi ele. Quando eu estava contigo, VOCE era a minha necessidade e fui obrigada a viver sem ela. Agora você realmente acha que eu vou fazer com que ele sinta o mesmo? Eu sei, ele sabe também, nossas necessidades, minha e dele, são diferentes. Mas eu não posso suportar imaginar ele mal. Eu não consigo me imaginar sem ele pra confiar...
Minha garganta estava seca e inchada. Minha cara vermelha, borrada e molhada. Minha cabeça estava um caos.
- Você pode confiar em mim...
- Aham, a coisa mais fácil a se fazer não é? É mais fácil confiar em um cara que te transformou em pó do que confiar em um guri que, pacientemente, foi juntando todo pó para transformar em argila. Uma coisa é verdade: os esforços dele vão ser em vão, porque mesmo eu beijando ele, não vou me apaixonar por ele. Porque você existe.
- Então, afinal, eu sou o problema?
- Não. Você poderia ter sido a solução, mas você não quis e agora é tarde demais pra isso.
Levantei-me e sai. Não esperava que ele me seguisse. Fui andando pela praia sozinha. A praia socada de desconhecidos para mim estava vazia. Depois de andar, arrastar-me seria um termo melhor, meus joelhos cederam e eu cai ajoelhada na areia. Procurei no meu bolso o celular. Encontrei um numero tao conhecido meu e esperei que ele atendesse.
- Oi, Mari!
- Oi...!
Como era bom ouvir aquela voz. A voz de um amigo...
- Algum problema...?
- É, mais ou menos, pode me encontrar aqui na praia? Eu to perto da sorveteria, Ru.
- Aham, to indo.
- Não demora, ta?
- Ta.
Estava desligando quando ouvi um "eeei" vindo do celular.
- Te amo.
Fiquei muda e simplesmente desliguei o celular. E chorei, chorei esperando por aquele que, eu sei, me faria chorar mais. Era egoísmo, mas era bom. Era bom poder confiar nele.

FIM


Escrito por: Fernanda Habitzreiter, nossa futura autora privilegiada!